Bosque de Dodona

           O portal criado por Lucille era bastante peculiar. A sensação que ele provocava era semelhante ao que sentimos quando mergulhamos em uma piscina fria, com a diferença de que ao emergir, estava completamente seco. Agora, e permitindo-se o toque de malícia e humor cruel, minha irmã não havia mencionado nada sobre o lugar onde aquele exato portal iria me levar. Pisando na área silvestre do Bosque de Dodona, tudo em que pude pensar foi na natureza irônica daquela localização. Afinal, uma cartomante certamente escolheria um local conhecido pelo seu passado divinatório. A questão era que ela parecia ignorar completamente a potencial insegurança daquele ambiente para um semideus mágico. Sensitivo à profecia ou não, um semideus de qualquer natureza teria dificuldades ali. No meu caso aquilo era particularmente preocupante. No entanto, algo me dizia que Giovanni era o tipo de homem que sabia cuidar de si mesmo. Meu novo amigo tinha aceitado vir comigo através do portal, deixando para trás o grande evento de São Valentim organizado por Afrodite. Na verdade, estávamos mesmo fugindo da arrumação. Mas ele tinha um ar misterioso e uma beleza esperta que fazia com que fosse curioso conhecê-lo melhor. Sentia que devia a oportunidade de conversar mais com aquele cara, especialmente depois de tê-lo confundido com alguém que eu odiaria encontrar. Talvez eu devesse a ele uma explicação ou duas. E a julgar pelos comentários que ele fizera anteriormente, talvez ele também estivesse inclinado a me ouvir.

— Esse Bosque é lindo, mas não preste atenção às vozes das árvores. Algumas dizem do futuro, mas a maioria é enganadora. Outra parte, pode nos contar sobre coisas que não suportaríamos saber. Mas uma ou outra, por vezes nos presenteia com sussurros e aconselhamento. — Sem perceber, toquei na mão do homem chamado Giovanni e o puxei de leve até uma pequena clareira no bosque. Ali, repousava o maior carvalho de todos. — Aqui, no galho mais baixo...

         Inclinei o rosto para próximo do sino, que não parecia dizer nada. Logo uma enorme ventania levantou as folhas caídas no local, e foi quase como se o matagal envolvesse os corpos ali presentes.

               

        O sopro do sino de vento silvou através do local, enchendo toda a região com a única palavra proferida. Não tinha muito o que interpretar, mas eu estanquei, observando as reações de Giovanni. Não era como se uma árvore, ainda que fosse a árvore de Réia, pudesse ditar o que um ou outro deveria fazer. Nem havia garantia alguma de a quem destinava-se a mensagem. Sorrindo ao afastar-me, apenas balancei a cabeça defensivamente.

— Sabe, é por isso que não gosto de oráculos. Tanta coisa pra dizer, e nem nos dão mais de uma palavra. — Colocando um pouco do cabelo que já estava muito crescido atrás da orelha, sorri sem jeito. — Desculpa por te colocar nesta furada. Mas acho que aqui ao pé do carvalho, ao menos não seremos interrompidos... E podemos dizer o que quisermos, afinal, só as árvores são nossas testemunhas...

          Observando o céu noturno, admirei-me da beleza da noite e das estrelas. Hécate podia representar as três faces da lua, ao lado de Ártemis e Selene, mas a noite era Nyx. Majestosa e reluzente em sua negritude. Eu amava como meus poderes respondiam à minha avó Primordial. Minha pele eriçava-se sob a luz dos seus muitos poderes. Pois a mãe de Hécate era a raiz da magia, enquanto minha mãe era o tronco e os galhos da mesma árvore. Notando que tinha ficado por tempo demais em contemplação, fitei os olhos daquele que me acompanhava mais uma vez. Era de uma forma absurda e precipitada, reconfortante tê-lo ali.

a meeting in the dark.